segunda-feira, abril 25, 2011

O Caso Aécio


Ulysses Guimarães, ao mesmo tempo presidente do PMDB, da Câmara dos Deputados e da Assembléia Nacional Constituinte nos idos de 80 do século passado, bebia bem, muito bem.
Assim como Miguel Arraes, Tancredo Neves (menos), Lula e Fernando Henrique Cardoso (discretamente), escreveu ontem, em O Globo, o jornalista Jorge Bastos Moreno. Oportuna matéria.
Mas nela não há registro de que um só desses políticos tenha dirigido após ter bebido além da conta. Ou de que tenha sido detido em alguma blitz. Ou ainda que tenha se recusado a fazer o teste do bafômetro.
Não havia bafômetros na época, embora motoristas embriagados, muitas vezes, fossem parar em delegacias.
O senador Aécio Neves (PSDB-MG) foi pego por uma blitz no bairro do Leblon, no Rio de Janeiro. Dirigia seu Land Rover. Estava acompanhado da namorada.
Aplicaram-lhe duas multas. Uma por dirigir com a carteira de habilitação vencida há um mês. Outra por dirigir alcoolizado. É o que consta no auto de infração do Detran do Rio.
Não foi a recusa de Aécio em se submeter ao teste do bafômetro que levou a autoridade policial a autuá-lo por dirigir supostamente sob efeito de álcool. A recusa apenas fortaleceu a impressão da autoridade de que estava diante de uma pessoa que havia bebido – e que, no entanto, conduzia um veículo. O que é proibido por lei.
Ninguém é obrigado a produzir provas que o incriminem. Está na lei. Aécio, portanto, não era obrigado a soprar no bafômetro. Mas esse tipo de teste equivale mais ou menos ao exame de DNA para comprovação de paternidade.
Quando alguém se recusa a fazer o exame de DNA é porque receia que o resultado seja positivo.
No passado, aqui e em toda parte, a imprensa fingia desconhecer certos comportamentos censuráveis dos políticos e de poderosos em geral.
Prevalecia o entendimento de que a vida privada de homens públicos somente a eles interessava – a mais ninguém. Ao público deveriam interessar os atos derivados do exercício do poder público.
O presidente John Kennedy foi um farrista emérito. Divertia-se com garotas de programa na piscina da Casa Branca sob a proteção de agentes do Serviço Secreto.
Se a primeira dama Jacqueline estava para chegar ao local, ele era avisado a tempo de abandonar a piscina e de dispensar as garotas sem correr o risco de um flagrante.
Não havia um só jornalista importante em Washington que desconhecesse os prazeres desfrutados por Kennedy. Mas quem ousava escrever a respeito?
Esse tipo de cultura mudou por lá – e um pouco em outros lugares. Quantos aspirantes a candidato à presidência dos Estados Unidos não desistiram de concorrer porque foram pilhados traindo suas mulheres?
O primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi meteu-se em apuros porque não resiste à tentação de um rabo de saia.
Promoveu festas de arromba em sua mansão. Valeu-se de recursos públicos para isso. Responde a processo por ter atraído uma marroquina menor de idade para uma sessão de sexo coletivo.
Aécio é solteiro. Pode namorar quem quiser. E trocar de namorada quantas vezes quiser. Ninguém tem nada a ver com isso.
Se quiser também pode ficar de porre com frequência – desde que não seja na hora do expediente como senador. Nem em locais públicos para não dar o mau exemplo. Beber muito provoca danos à saúde.
Dirigir depois de ter bebido, isso Aécio não pode. Ninguém pode. Fere a lei. Põe em risco a própria vida e a vida dos outros.
É natural que o bom exemplo seja dado por quem pode mais. E que se cobre de quem pode mais o bom exemplo.
A aplicação da lei não deveria distinguir entre os que podem muito e os que nada podem.
Entre nós, infelizmente, os encarregados de aplicar a lei costumam, sim, distinguir entre o cidadão comum e o que se imagina incomum.
(A categoria dos cidadãos incomuns foi instituída por Lula. E dela faz parte o senador José Sarney.)
O policial que atirou no assassino de crianças em Realengo foi elogiado por seus superiores e promovido. Premiou-se o agente público que cumpriu seu dever.
Por que não fazer o mesmo com o policial que multou Aécio?

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