domingo, março 15, 2015

Atraso em votação do Orçamento expõe desgaste com Legislativo

Problemas de diálogo, entraves na economia e denúncias na Petrobras emperram deliberação da lei orçamentária

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Está prevista para a próxima terça-feira (17) a sessão do Congresso Nacional destinada à votação da matéria para o ano de 2015
FOTO: AGÊNCIA SENADO
A votação do Orçamento 2015, pauta essencial para garantir ao governo federal a manutenção da máquina pública, vem se arrastando no Congresso desde o ano passado. O atraso na deliberação da proposta da Lei Orçamentária Anual (LOA), cujo prazo deveria ser até dezembro, põe em risco investimentos em áreas prioritárias que podem ser prejudicadas com o entrave nos repasses dos recursos.
Segundo o professor de ciências políticas da Universidade de Fortaleza (Unifor), Francisco Moreira, não é de hoje que a LOA virou moeda de troca nas negociações entre o Executivo e o Legislativo. "Os parlamentares usam como mercadoria no balcão de negócios do Congresso uma pauta que é fundamental para o funcionamento do País", avaliou especialista.
Nos últimos três anos, ficaram ainda mais evidentes as dificuldades do Palácio do Planalto de conseguir o apoio dos congressistas para aprovar a lei orçamentária. A LOA de 2013, a segunda criada pelo Governo Dilma Rousseff, foi aprovada com 70 dias de atraso e só após o Planalto aceitar a derrubada do veto sobre os royalties de petróleo. No mesmo ano, a queda de braço nas negociações sobre o Orçamento de 2014 não demorou mais do que uma madrugada somente porque o Executivo firmou o compromisso de pagar um "bônus" de R$ 2 milhões em emendas parlamentares para integrantes da Comissão Mista de Orçamento.
No dia 3 de março, o governo cedeu, mais uma vez, à política do "toma-lá-dá-cá" do Legislativo ao aceitar a liberação de R$ 10 milhões em emendas por parlamentar novato para que não haja impedimentos para aprovar o Orçamento. Apesar do esforço, a matéria continua emperrada. Alegando falta de consenso, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), marcou uma votação para a próxima terça-feira (17).
O líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE) diz que é "natural a disputa política porque o cobertor é curto", já que cada parlamentar quer levar recurso para a sua região. "Estou trabalhando para que possamos votar o Orçamento nos próximos dias", afirmou.
Falta de compromisso
"A nossa função (do governo) é agilizar para garantir a votação o quanto antes", defendeu o líder do governo na Câmara Federal, deputado José Nobre Guimarães (PT-CE), para o qual o atraso na apreciação da proposta se deve ao "pouco compromisso que alguns têm com o País".
"É inacreditável que até agora não tenha sido votado o Orçamento. A oposição quer paralisar o País. A oposição não discute e a base tem dificuldade de agilizar a votação", afirmou.
Especialistas avaliam que entre os motivos para o entrave na votação estão a nova distribuição partidária no Legislativo, a crise econômica e as denúncias de envolvimentos de parlamentares em desvios na Petrobras.
A cientista política do Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais (Ibmec), no Rio de Janeiro, Christiane Romêo explica que o Congresso, nesta nova configuração, tem mais partidos que no período anterior. Por conta disso, se já havia "rachas" entre os interesses da base aliada do governo, nessa legislatura, essas diferenças aumentam mais.
"Esse atraso na votação do Orçamento revela a dificuldade do governo de dialogar com a própria base no Congresso. O Executivo enfrenta sérios problemas de articulação que se arrastam já há alguns anos", concordou o cientista político da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Ernani Carvalho.
Crise econômica
Para o especialista da UFPE, a recessão econômica tem sido responsável pela instabilidade na relação do Planalto com os congressistas porque a presidente quer aprovar um Orçamento mais enxuto a fim de equilibrar as contas públicas. Em contrapartida, o Congresso está ávido para aumentar os gastos para atender às bases.
"Há uma barganha no Congresso por um parcela do Orçamento que, com o recrudescimento da crise, sofreu cortes maiores do que nos outros anos", disse Carvalho.
Lava-Jato
A s denúncias da Operação Lava-Jato, que investiga desvios na Petrobras, tem relação direta com a paralisação do Congresso e o consequente entrave na votação da LOA, segundo o cientista político da Unifor, Clésio Arruda. O analista observa que, diante da divulgação da lista de parlamentares envolvidos em irregularidades na estatal, políticos tanto da base quanto da oposição têm usado o Orçamento como moeda de troca, exigindo do Executivo reforço na defesa.
Além disso, essa demora na votação tira o foco dos suspeitos de participação no esquema e prejudica a imagem do Executivo. "Quanto mais isso se retarda, mais o governo sai desgastado", disse o professor.
Situação cômoda
Em outra perspectiva, Ernani Carvalho, da UFPE, considera que a demora na deliberação da Lei Orçamentária Anual é uma situação confortável para o Executivo, que busca aprovar um Orçamento mais enxuto. "A presidente não tem como forçar o Congresso a votar então ela tá tentando tirar proveito disso. É uma situação cômoda porque ela pode dizer que o Congresso não votou".
Falta de verbas põe prioridades em risco
A receita total estimada para o Orçamento 2015 é de R$ 2,140 trilhões. Segundo especialistas, o atraso na votação da proposta orçamentária preocupa porque pode prejudicar a administração pública, já que é por meio desta previsão que o governo poderá planejar as despesas para o ano, garantindo os recursos destinados a hospitais, manutenção das estradas, construção de escolas, entre outros.
A cientista política do Ibmec-RJ, Christiane Romêo, avalia que todo atraso em relação ao orçamento impacta na realização de projetos, no cumprimento de metas e ainda na credibilidade do governo em honrar contas e promessas. "Um impasse entre o Legislativo e o Executivo, pode gerar uma paralisia nas decisões políticas, afetando como um todo o funcionamento normal do País", disse a especialista.
"O Orçamento é essencial para o País. Como é que os ministros vão liberar recursos? As obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), saúde e educação precisam de Orçamento. A nossa função é agilizar para garantir a votação o quanto antes", declarou o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE).
O líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), considera que não é um grave problema quando o atraso ocorre nos primeiros meses do ano, pois há autorização legal para o Executivo gastar 1/12 da lei orçamentária do ano anterior, o que resolve boa parte das necessidades. No entanto, de acordo com o petista, à medida que os meses avançam, torna-se necessário ter a lei aprovada e sancionada. "Não acredito que chegaremos ao ponto em que haja prejuízo a qualquer setor. O Congresso tem responsabilidade para aprovar o Orçamento antes", prevê o senador.
Julianna Sampaio
Repórter

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