quarta-feira, agosto 19, 2015

Uso de bancos públicos para ajudar indústria mostra que Dilma persiste nos mesmos erros


Presidente Dilma Rousseff durante cerimônia de anúncio do Programa de Investimento em Energia Elétrica no Palácio do Planalto, em Brasília (DF) - 11/08/2015
Mais estímulo: Dilma chancela crédito mais barato à indústria em período de ajuste fiscal(Ueslei Marcelino/Reuters)
O anúncio da presidente da Caixa Econômica Federal, Miriam Belchior, nesta terça-feira, de que reduzirá os juros de linhas de crédito para o setor automotivo como forma de estimular o emprego no setor, mostra que o governo persiste nos mesmos erros. Ainda que a orientação da política econômica tenha dado uma guinada necessária em direção à ortodoxia, a medida sugere que há restos apodrecidos da 'nova matriz econômica' que ainda não foram completamente extirpados. Miriam Belchior atribuiu a Dilma a autoria do projeto que prevê o uso da Caixa e do Banco do Brasil para replicar a mesma política de redução de juros a outros setores, como o de celulose, o da construção civil e o de eletroeletrônicos. Com apenas uma tacada, o governo comete equívoco duplo: se compromete a dar estímulos num momento de escassez de recursos públicos - e sem que o ajuste fiscal prometido desde o começo do ano tenha sido concluído - e volta a selecionar setores específicos como alvo das benesses, criando bolsões artificiais protegidos contra a crise.

A medida se assemelha à que foi anunciada em 2012, quando o governo forçou a redução dos juros bancários ao consumidor por meio da Caixa e do Banco do Brasil, com o objetivo de atingir, indiretamente, as taxas praticadas também pelos bancos privados. À época, a Selic estava em 9% ao ano e a presidente não se acanhava em dizer publicamente para onde queria que caminhassem os juros básicos - movimento periogoso tendo em vista que as decisões do BC são, em teoria, técnicas, não políticas. Neste período, rompeu-se, entre outras coisas, a confiança do mercado na independência do Banco Central - confiança que não se recompôs mesmo com a sequência de aumentos na taxa de juros que já se estende por mais de um ano, na tentativa de conter o avanço da inflação.
A ideia do governo, ao forçar juros mais baixos para empresas, é criar condições atrativas para o investimento privado num momento em que o BNDES não dispõe da musculatura de outros tempos para sustentar aportes à indústria. Em junho, os financiamentos do banco de fomento para empresascaíram 0,3%. Os cortes de gastos atingiram em cheio as operações do banco. Já as desonerações, que aliviam a carga tributária do setor produtivo, estão prestes a ser extintas em projeto de lei que pode ser aprovado pelo Senado ainda esta semana. Os setores da indústria escolhidos a dedo para receber o "empurrãozinho" tão costumeiro no primeiro governo Dilma obviamente receberam a notícia com euforia - e para eles tanto faz se o dinheiro vem do BNDES ou dos bancos públicos.
Um governo que padece de uma crise de confiança não poderia se dar ao luxo de usar a Caixa e o Banco do Brasil como braço executor de políticas de estímulo econômico.
Um governo que propõe pacotes como o desta terça-feira perde o direito de reclamar da existência de uma "pauta-bomba" do Congresso para aumentar o gasto público.
Um governo que ainda não aprovou o ajuste fiscal do qual depende a manutenção do grau de investimento do Brasil se mostra inconsequente em todos os seus níveis - da presidente, a quem foi atribuída a autoria da ideia, à ala insensata de sua equipe econômica.
Todos os bancos brasileiros sofreram, na última semana, corte em sua nota de investimento pela agência Moody's, e estão cada vez mais próximos do rebaixamento. Por comportamento pregresso, as agências não deverão fazer vista grossa às instituições públicas caso o pacote de bondades saia do papel. Sob o pretexto de ajudar a indústria, alimentando-a com uma ração atualmente insustentável, o governo coloca todo o Brasil, e não apenas setores escolhidos a dedo, mais próximo do precipício.

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