quarta-feira, setembro 21, 2016

Caciques direcionam doações para redutos eleitorais

Enquanto candidatos em grandes capitais se digladiam por repasses dos partidos para as eleições municipais de outubro, as principais legendas têm utilizado boa parte dos recursos do fundo partidário para privilegiar candidatos de seus redutos eleitorais. São pequenas e médias cidades que, por serem consideradas cruciais para a manutenção da influência política de caciques, furam a fila de repasses e abocanham recursos que poderiam ser destinados a capitais.
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No PMDB, por exemplo, que já teve de ouvir reclamações de falta de dinheiro de candidatos como Marta Suplicy, em São Paulo, ou Marcos Rotta, vice em Manaus, foram direcionados repasses expressivos para cidades do Ceará, estado do tesoureiro da legenda, Eunício Oliveira, e de Roraima, por onde foi eleito o presidente da sigla Romero Jucá. O ex-senador peemedebista e ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo também conseguiu garantir repasses polpudos – 200.000 reais – para o irmão Veneziano, candidato a prefeito de Campina Grande.
Para a pequena Lavras da Mangabeira, de 31.000 habitantes, foram 100.000 reais do fundo partidário para Ildsser Alencar Lopes, quase 20% do limite máximo permitido pela Justiça Eleitoral. Detalhe: Lavras da Mangabeira é a cidade natal de Eunício Oliveira. Em Sobral, para fazer frente à candidatura de Ivo Gomes, irmão de Ciro e Cid Gomes, o PMDB de Eunício enviou 200.000 reais para o candidato Moses Rodrigues em uma ofensiva para acabar com duas décadas de hegemonia política dos Ferreira Gomes. Moses deixou o PPS e migrou para o PMDB no início do ano a convite do próprio Eunício.
Em Roraima, estado de Romero Jucá, o candidato Maranhense das Verduras, que disputa a prefeitura de Cantá, recebeu do PMDB 70.000 reais, o equivalente a 41% do limite de gastos estabelecido para a campanha do município de pouco mais de 15.000 habitantes. Recentemente Jucá teve os sigilos bancário e fiscal quebrados por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeitas de que o então prefeito da mesma cidade de Cantá repassava propina ao senador depois de licitações superfaturadas na cidade. O valor de 70.000 reais também foi enviado a candidatos aliados do peemedebista nos municípios de São Luiz, Caroebe, Amajari, Iracema e São João da Baliza, todos em Roraima. Em quatro dessas cidades, os repasses do PMDB equivalem a 65% do limite máximo de gastos permitidos para a campanha.
O Partido Progressista (PP), sigla que tem o maior número de políticos enrolados com o escândalo da Lava-Jato, priorizou, até o dia 19 de setembro, cidades de interesse do ministro da Saúde Ricardo Barros, que também é tesoureiro da sigla. A candidatura da filha de Barros, Maria Victoria Barros, em Curitiba, recebeu 301.000 reais do partido. Para Londrina, foram 300.000 reais para Marcelo Belinati. A campanha do irmão do ministro, Silvio Barros, em Maringá, recebeu 250.000 reais. De acordo com o presidente do partido, Ciro Nogueira, “o número de parlamentares das bancadas federais por Estado foi o fator considerado para a destinação das doações”. Os maiores bancadas da sigla, no entanto, são Rio Grande do Sul, Bahia e Minas Gerais, e não a bancada do Paraná. Por meio de sua assessoria, Nogueira afirmou que “jamais tratou com o ministro Ricardo Barros sobre repasses do Fundo Partidário para as campanhas municipais”. “Não há interferência dos ministros na escolha da destinação dos repasses”, disse.
No PSB, como esperado, as atenções estão voltadas para a manutenção da hegemonia do partido em Pernambuco, berço político dos principais ícones socialistas, Eduardo Campos e Miguel Arraes. Do montante total de receitas registradas até agora na Justiça Eleitoral, 40% – ou 2,1 milhões de reais – foram destinados para a campanha à reeleição de Geraldo Júlio na capital.
Além de Recife, cidades vinculadas a caciques do partido também foram generosamente abastecidas na campanha. Apenas para Petrolina foram repassados, por ora, 400.000 reais para a campanha de Miguel Coelho, filho do senador e ex-ministro Fernando Bezerra. Braço-direito de Eduardo Campos, Bezerra Coelho é outro investigado na Lava Jato – sobre ele, recaem as acusações de ter pedido propina da Petrobras para a campanha do ex-governador.
Nas remessas de dinheiro para as campanhas municipais, há ainda outras ligações diretas com Eduardo Campos e articuladas pessoalmente pelo seu sucessor e aliado, o governador Paulo Câmara: primo de Renata Campos, viúva de Eduardo, o candidato Heraldo Selva recebeu 250.000 reais para a disputa pela prefeitura de Jaboatão dos Guararapes. Calouro na política, o irmão de Campos, Antônio, recebeu o mesmo valor reais para turbinar sua corrida pela prefeitura de Olinda, que tem como prefeito Renildo Calheiros, irmão do presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL).
Também chama atenção a campanha do PSB em Salgueiro, município do interior pernambucano com menos de 60.000 habitantes. O candidato Marcelo Sá recebeu 150.000 reais do caixa do PSB – o equivalente a 60% do limite de gastos autorizado pela Justiça. Enquanto isso, os candidatos da legenda em Goiânia e Macapá, por exemplo, embolsaram apenas 100.000 reais. Em Florianópolis, sequer houve repasses para o socialista Murilo Flores.
Se nos principais partidos fica nítida a vinculação entre seus caciques e o direcionamento financeiro das campanhas, o PT, em franco processo de derretimento e com a principal estrela está sob ameaça de prisão, fechou a torneira para o reduto do ex-presidente Lula. Ao ABC paulista, onde Lula iniciou a carreira política ao liderar greves sindicais, sobraram apenas tímidos repasses. Tarcisio Secoli, candidato a prefeito de São Bernardo do Campo, ganhou apenas 5.040 reais, vindos do diretório municipal. Já o candidato de São Caetano do Sul, Marcio Della Bella, levou pouco mais da metade: 2.840 reais. Na região, o principal beneficiado foi o sindicalista Carlos Grana, candidato a reeleição em Santo André, que recebeu 81.827 reais da direção municipal. O candidato de Diadema, Maninho, não obteve um mísero centavo de apoio financeiro do PT.

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