sexta-feira, junho 16, 2017

‘Se ficar difícil, cabe a quem tem responsabilidade renunciar’

Para o ex-presidente Fernando Henrique CardosoMichel Temer terá uma chance de “se explicar ao país” no momento em que a Procuradoria-Geral da República oferecer denúncia contra ele. Mas, a depender dessa explicação, e do surgimento de fatos novos, não restaria ao presidente melhor saída que “tomar ele próprio a decisão”.
O comentário mais ameno entre os críticos da decisão do PSDB de permanecer no governo foi que, com ela, o partido deixou de se diferenciar do PT no plano ético e se igualou ao PMDB no modo de fazer política. O senhor discorda disso?
Eu compreendo esse modo de ver as coisas. Porém, se você encarar de outro ponto de vista, o que houve foi que o PSDB pesou o que aconteceria com o governo e com o país. Não foram todos, claro. Uns tomaram a decisão pensando em si, outros pensando na imagem do partido. Quando se pensa na questão com mais responsabilidade, o que se conclui é que o PSDB, ao sair, tira o tapete do governo. E fazemos o que depois? A racionalização da questão por parte dos mais responsáveis é que a saída do PSDB do governo desequilibra o sistema. Mas, como a situação está complicada e a cada dia há fatos novos, é natural que as pessoas mais responsáveis também acompanhem essas transformações.
Qual o limite de tolerância do PSDB?
Acho que já passou do limite.
Então o que falta para o partido desembarcar?
Os fatos vão aparecendo semana a semana. A questão que vai se colocar, vai continuar se colocando, é como o governo vai reagir ao que está aí. O governo vai convencer a sociedade de que aquela conversa com o Joesley foi apenas uma cilada ou onde tem fumaça tem fogo?
Qual a sua opinião sobre isso?
Minha opinião é que ele tem de explicar duas coisas: as malas. São duas malas de dinheiro. Para quem foram? Que caminho tomaram? A segunda coisa: houve alteração na fita? Por isso é que o PSDB tomou tempo: você tem de dar o direito de defesa ao presidente da República. Mas, dado o direito, ele tem de se defender. Tem de convencer o país.
Mas ele já não teve tempo suficiente?
Vamos ver o que o procurador-geral da República vai dizer. A denúncia é vazia ou concreta? Se for concreta, o governo vai ter de se explicar. O mesmo vale para todos.
Para Aécio Neves também? 
Claro, não é diferente. O Aécio diz: “Minha irmã foi vender um apartamento da minha mãe”. É verdade. Ele tem a mãe, tem o apartamento e tem a irmã. Ela foi lá. O outro propôs, numa cilada, emprestar dinheiro.
É essa a sua convicção sobre o episódio? De que ele caiu em uma cilada? 
Estou dizendo que eu sei que ele tem um apartamento que queria vender. Isso é verdade. Agora, tem de explicar o caminho do dinheiro também. É a mesma coisa. O que tem dado credibilidade aos procuradores de Curitiba? É que eles têm explicado o caminho do dinheiro.
O senhor recebeu apelos de empresários para que o ­PSDB mantivesse o apoio ao governo? 
Não. Nenhum empresário me procurou. Eu não dou muita importância a essas angústias de Bolsa, sobe e desce. É óbvio que o Brasil precisa de mais investimento, e isso independe de empresário querer ou não querer. Mas temos de ter a medida da responsabilidade. E pesar as consequências das atitudes que tomamos. Chega um ponto, porém, em que você tem de tomar uma decisão mesmo que algo negativo ocorra.
A percepção de muita gente é que o PSDB sempre demora muito a tomar uma decisão. Dá a impressão de que estamos empurrando com a barriga, não é?
E pode ser mesmo. Existe esse risco de que estejamos empurrando com a barriga. Eu tenho uma visão, que nunca externei desta maneira, de que esse sistema todo vai sofrer um abalo. Então, acho que você tem de começar a pensar: “Bom, deixe que venha o abalo”. Nós já demos, estamos dando, um pouco mais de chance ao governo de se explicar ao país. Então, a partir de certo ponto, talvez seja melhor deixar que venha o abalo.
O que poderia ser esse abalo? 
Não sei, mas toda semana tem uma flechada nova. Se a situação se tornar muito difícil, caberá a quem tem responsabilidade abrir espaço — ou seja, renunciar. Renunciar para poder abrir espaço para uma solução constitucional. Constitucionalmente, ou o presidente renuncia ou o Tribunal ou a Câmara o impedem, não há outro caminho. Como o TSE não o impediu e a Câmara está longe de im­pedi-lo, você vê que o que restaria seria o próprio presidente tomar a decisão. Fora disso, você vai alterar as regras constitucionais.
Nessa hipótese, o senhor cogitaria can­didatar-se? 
Candidatura não pode ser de cada um. Os outros é que têm de querer. Acho que, passada essa tormenta toda, teremos de reunificar o Brasil, não podemos continuar nessa luta odienta. E, quando eu falo em reunificar, não estou excluindo ninguém, nem o PT, nem o PSOL, nem a Marina (Marina Silva). Mas quem escolhe qual é o peso que cada um merece ter? É o povo.
Mas aqui estamos falando de uma eleição indireta. 
Na minha opinião, qualquer que venha a ser o eleito indireto, ele terá de se comprometer com uma coisa. Fosse eu o indireto, o que poderia fazer lá? Chamar eleições. Claro que leva tempo. Mas tem de abrir uma janela de esperança para o país. “Olha, eu estou consertando as coisas aqui, quero ouvir vocês, vou ouvir em tal época, e aí vocês decidem o que querem fazer.” O certo é o Temer chegar até 2018. Mas, se isso for quebrado, imagine qual será a base de sustentação, política e moral, que alguém eleito pelo Congresso teria para continuar um ano e meio. Não tem como. É por isso que é preciso haver um entendimento das forças nacionais para definir o caminho que vamos trilhar. “O caminho é este.” Então, quem levará o país por esse caminho? O nome conta menos que essa definição. Tem de ser alguém que seja capaz de se expressar para o país.
Se houvesse um apelo, o senhor aceitaria ser essa pessoa? 
Acho que não vai haver esse apelo, e não quero que haja. Agora, diante das circunstâncias, ninguém pode dizer não a isso. Acho que não serei eu essa pessoa. Não me proponho, não desejo e não acho necessário. Acho que precisa ser alguém com mais energia do que eu. E eu já fui presidente.

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