segunda-feira, agosto 14, 2017

Ex-governador Agnelo desviou ingressos de operários do estádio, diz delator

Mané Garrincha, em Brasília, o estádio mais caro da Copa do Mundo de 2014 (Foto: Getty Images)
O então governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), era o convidado mais ilustre em um churrasco realizado no canteiro de obras do estádio Mané Garrincha, em Brasília, no início de 2013. Confraternizando com operários, todos comemoravam que os trabalhos já estavam na reta final. Em 18 de maio, o estádio seria inaugurado com um jogo de futebol entre duas equipes locais, o Brasiliense e o Brasília, pela final do Candangão (campeonato do Distrito Federal).
Naquele churrasco, esbanjando simpatia e conversando com os operários, Agnelo fez uma promessa: eles receberiam dois ingressos para assistir ao jogo inaugural. O fato entrou na delação da Andrade Gutierrez, porque Agnelo pediu que um dos diretores da empreiteira responsável pela obra, Carlos José de Souza, providenciasse a aquisição de 15 mil ingressos para os trabalhadores. Em complementação de sua delação premiada, Carlos José revela que a compra foi descontada do caixa de propina destinada a Agnelo por conta da obra e apresentou um comprovante de pagamento de R$ 300 mil à Federação Brasiliense de Futebol, relativo aos ingressos.
Mas Agnelo, segundo o delator, passou a perna nos operários. Requisitou metade dos ingressos comprados pela Andrade Gutierrez, deixando os trabalhadores desfalcados. "Metade dos ingressos foi requisitada e entregue na recepção da Secretaria da Copa por solicitação do governador, ocasionando inclusive insatisfação por parte dos trabalhadores do estádio que contavam em receber dois ingressos cada um e vieram a receber apenas um ingresso", diz a complementação da delação.
Trecho de complementação da delação premiada de Carlos José de Souza, da Andrade Gutierrez (Foto: Reprodução)
O material foi juntado, no mês passado, ao inquérito da Operação Panatenaico, que investiga suspeitas de pagamentos de propina das empreiteiras que construíram o estádio a políticos do Distrito Federal. Agnelo chegou a ser preso temporariamente em maio pela Justiça Federal do Distrito Federal, mas solto depois de um habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Os depoimentos apontam que o PT e o PMDB recebiam porcentuais de propina pela obra.
A documentação, obtida por ÉPOCA, comprova que o consórcio, composto por Andrade e Via Engenharia, teve de bancar, por fora, várias despesas solicitadas por Agnelo e que não tinham relação com a obra. Segundo Carlos José, um de seus superiores determinou, em 2011, que atendesse a pedidos de Agnelo. "Então o declarante foi pessoalmente instado diversas vezes pelo sr. Agnelo Queiroz para o custeio de demandas variadas", afirmou em seu primeiro depoimento.
Nota fiscal entregue por Andrade Gutierrez para comprovar compra de ingressos a pedido de Agnelo (Foto: Reprodução)
Na complementação, entregue no mês passado, Carlos José detalhou os pedidos. "Em sua maioria, trata-se de serviços efetivamente prestados, mas que, no entanto, tinham seus valores descontados do porcentual de propina ajustados com Agnelo Queiroz", diz a complementação da delação. No caso do jogo inaugural, a Andrade bancou ainda R$ 4 mil para serviços de bufê e R$ 4.315,20 na compra de uísque.
Outro exemplo: segundo o delator, Agnelo pediu a aquisição de ingressos para um camarote no estádio, porque ele tinha muitos convidados para o evento e o camarote das autoridades não comportaria a todos. Tratava-se de um jogo-teste no Mané Garrincha entre Santos e Flamengo, realizado em 25 de maio de 2013. A Andrade apresentou diversos comprovantes de despesas para esses camarotes, que totalizaram cerca de R$ 330 mil. Entre eles estão a compra de 186 ingressos e o fornecimento de serviços de comida e bebida, além de locação de vasos ornamentais.
Nota fiscal entregue por Andrade Gutierrez mostra aluguel de vasos ornamentais para jogo no Mané Garrincha (Foto: Reprodução)

Agnelo pediu até mesmo que a empreiteira bancasse novos uniformes para o time do Brasília, que seriam usados no jogo inaugural. Segundo a Andrade, foram gastos R$ 67.749,92 na Adidas com essa aquisição.
A documentação inclui ainda a contratação de serviços de mídias sociais no valor de R$ 1,8 milhão, que foram prestados para Agnelo, mas bancados pela Andrade.
Procurado, o advogado de Agnelo, Daniel Gerber, negou as irregularidades apontadas: "Jamais houve favorecimento de empresas, ou qualquer espécie de ilícito de sua parte. Não obstante, sempre que pôde, requisitou aos empresários auxílio para as camadas mais pobres da população, em acordo com a consciência social de cada um".

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