domingo, agosto 27, 2017

Testemunha conta que 100º PM morto no Rio foi executado com disparos da própria arma

Polícia faz perícia no local do crime
Polícia faz perícia no local do crime Foto: Fabiano Rocha
Rafael Soares
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O sargento Fabio José Cavalcante e Sá, de 39 anos, havia saído do trabalho, no 34º BPM (Magé) e, como fazia em todo fim de semana de folga, foi participar de um churrasco com a família no Largo do Guedes, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, onde nasceu e foi criado. Quando chegou, por volta das 9h de ontem, parou o carro na calçada, entre a casa de sua família e a loja de seu pai.
Mal saiu do veículo, cerca de seis homens em dois carros pararam bruscamente e começaram a atirar cerca de 30 vezes com fuzis e pistolas. Depois que o sargento caiu no chão, dois homens saltaram. Recolheram documentos, um colar de ouro, um anel dourado com a silhueta de São Jorge e a pistola do policial. Em meio à súplica do pai, que estava no bar à frente e assistiu a toda a cena, para que não matassem o filho, um dos homens ainda descarregou o pente da arma do próprio PM no corpo inerte.
O relato é de uma testemunha ouvida na Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF) na tarde do último sábado. Para a polícia, não há dúvida: o centésimo PM a morrer no estado do Rio em 2017 foi executado. Ao todo, 11 tiros atingiram Cavalcante — quatro no rosto. A hipótese de latrocínio foi descartada.
O sargento ainda foi levado para a UPA do Parque Lafaiete, em Duque de Caxias, mas já chegou morto ao local. Apesar de não morar mais na região — ele se mudou para Magé, mais próximo do trabalho —, Cavalcante era visto no Largo do Guedes, por vizinhos e parentes, como um benfeitor: ajudava financeiramente quem passava por um aperto, dava festas para filhos de amigos sem dinheiro, participava do futebol do bairro quase toda semana. Nas últimas eleições, concorreu ao cargo de vereador em São João de Meriti. Obteve 1.090 votos, ficando com a segunda suplência.
Sargento Cavalcante queria ser político
Sargento Cavalcante queria ser político Foto: Reprodução
— Ele era muito conhecido aqui. Não tinha ninguém que não gostasse dele. Ajudava todo mundo, sem querer fazer propaganda com isso — disse uma vizinha que, assustada, preferiu não se identificar. Fabio era casado e deixa um filho de 8 anos. O PM será enterrado hoje no Cemitério Corte 8, em Duque de Caxias.
Polícia quer ouvir pai
Agentes da DHBF foram acionados em meio à folga para irem ao local do crime e começarem, imediatamente, a ouvir testemunhas. O corpo já havia sido levado para a UPA, mas os peritos da especializada conseguiram encontrar estojos e pelo menos quatro marcas dos disparos no chão. Duas testemunhas foram levadas para a delegacia. Uma delas estava atrás do PM no momento dos disparos. Os policiais ainda queriam levar o pai do policial, que viu toda a ação, para prestar depoimento. Ele, no entanto, havia sido medicado e será ouvido amanhã.
A viúva do sargento chora em frente à UPA
A viúva do sargento chora em frente à UPA Foto: Fabiano Rocha
Quase duas horas após o crime, parentes e amigos faziam uma fila na frente da casa dos pais de Fabinho — nome que o policial usou nas urnas, quando se candidatou, e usado por todos ao se referirem a ele. Para agentes da especializada, os principais suspeitos do crime são traficantes das favelas próximas, já que o local é cercado por comunidades dominadas pelo tráfico. Os criminosos não usavam toucas ninjas para esconder o rosto. Este ano, o policial reagiu a um assalto praticamente no mesmo local em que foi morto ontem. Na ocasião, ele foi ferido de raspão.
O comandante-geral da PM, coronel Wolney Dias, lamentou, em nota, a morte do sargento. “Para a PM, é um golpe a mais em nossas fileiras, parte de uma estatística inaceitável com a qual temos convivido dramaticamente há mais de duas décadas, mas que nem sempre ganha a mesma repercussão. Assim como todo cidadão, o policial é vítima da violência com uma desvantagem: ao ser identificado será executado sumariamente”, escreveu.
A Secretaria de Segurança também lamentou “profundamente” a morte do policial. “A família perde um ente querido, a corporação perde um profissional e a sociedade, mais um de seus defensores”, afirma a nota do órgão.
Em 2014, 112 militares foram mortos, numa média de um homicídio a cada três dias. Este ano, a média já está em um PM assassinado a cada dois dias.

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