segunda-feira, setembro 11, 2017

Lula segundo Palocci

Fazia 19 dias que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajava, quando subiu ao palco em uma praça em São Luís, capital do Maranhão, na terça-feira (5). Lula vinha de dezenas de discursos em 26 cidades, percorridas em três ônibus, numa caravana por nove estados do Nordeste, onde a popularidade de programas sociais como o Bolsa Família ainda lhe garante uma expressiva intenção de votos e a segurança de não ser vaiado. Mas faltava um último comício na viagem de pré-campanha eleitoral. De camisa branca para fora da calça, Lula começou a agradecer a presença das autoridades, como fez em todos os discursos anteriores. “Quero agradecer a cada mulher e a cada homem que está presente aqui nesta praça”, disse. “Quero agradecer aos movimentos sociais, às centrais sindicais, que tiveram uma dedicação extraordinária para que, em cada estado, a gente pudesse colher o carinho e as sugestões do povo brasileiro. Eu termino esta caravana muito grato a cada companheiro.” Era noite, a voz estava áspera, mas já estivera pior no meio da viagem.
Capa edição 1003  (Foto: Época)
Lula ainda não sabia, mas no dia seguinte seu mundo agradável de pré-­campanha explodiria sob o efeito de uma bomba: o depoimento de Antonio Palocci ao juiz Sergio Moro, em Curitiba. Grande parte do discurso de campanha de Lula, brandido exaustivamente na excursão pelo Nordeste, consiste em dizer-se vítima de perseguição – da Justiça, da imprensa, da “elite” do país. Vários depoimentos e delações que o comprometem são desqualificados por ser de integrantes dessa “elite”. Mas o que dizer de Palocci, amigo pessoal de Lula, figura-chave de seu governo, chefe da Casa Civil de Dilma? Pois foi Palocci quem, logo no início de seu depoimento, confirmou algumas das principais acusações feitas a Lula por Marcelo e Emílio Odebrecht na delação deste ano. Que o sítio de Atibaia é, sim, parte de um “pacote de propinas” – expressão de Palocci – dos empreiteiros. Que, como parte do mesmo pacote, a Odebrecht havia separado R$ 300 milhões para projetos pessoais de Lula e do PT. E que, ainda a título de agrado, a Odebrecht havia custeado os R$ 4 milhões do Instituto Lula.

  
Preso há um ano, com mais uma liminar pleiteando sua liberdade negada pelo Superior Tribunal de Justiça e com uma condenação a 12 anos de prisão em outro processo, Palocci ainda não selou um acordo. Tentou seduzir Moro e o Ministério Público, exibindo quanto sabe e quanto está disposto a falar. Em duas horas, com tom calmo e didático, dissecou boa parte da corrupção que testemunhou e ajudou a estruturar enquanto foi um dos mais poderosos políticos do país. “Quero começar dizendo que o conteúdo desta denúncia procede. É verdadeiro”, disse Palocci. Ele se refere à denúncia, terceira no âmbito da Lava Jato, que fala do pagamento de propina usando imóveis. Além de Moro, dezenas de advogados e integrantes do Ministério Público acompanharam o depoimento. É provável que nenhum deles esperasse ouvir Palocci explicar tão candidamente a relação entre Lula e a Odebrecht, com termos tão fortes e precisos. “O Emílio [Odebrecht] abordou [o Lula] no final de 2010 não foi para oferecer alguma coisa, doutor. Foi para fazer um pacto, que eu chamei de pacto de sangue. Porque envolvia um presente pessoal, que era um sítio; envolvia o prédio de um museu, pago pela empresa; envolvia palestras pagas a R$ 200 mil fora impostos combinadas com a Odebrecht para o próximo ano; e envolvia uma reserva de R$ 300 milhões [para o PT].” As reações petistas ao depoimento foram duas: em público, a óbvia, de desqualificar Palocci. O advogado de defesa de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse que “preso e sob pressão, Palocci negocia com o MP acordo de delação que exige que se justifiquem acusações falsas e sem provas contra Lula”. Privadamente, muitos petistas vislumbram nas palavras do ex-ministro o fim do sonho lulista de voltar ao poder, de sair da Lava Jato consagrado como vítima. Lula disse a interlocutores, segundo relatos à imprensa, que estava “decepcionado” com o companheiro

 
 

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