sexta-feira, dezembro 25, 2015

O 'BBB' da Lava Jato: intrigas, tensão, piadas... e delações

Polícia Federal de Curitiba
'NAVE LOUCA' DE CURITIBA – sede da Polícia Federal abriga os principais personagens do petrolão(Ivan Pacheco/VEJA)
Intrigas, choro, horas na academia, momentos de grande tensão e também de descontração - com direito a piadas sobre a falta de sexo no confinamento. As paredes da carceragem da Polícia Federal em Curitiba e do presídio de Pinhais, a 10 quilômetros dali, guardam histórias que poderiam soar como as que se ouvem em reality shows. Elas revelam a rotina e os momentos de aflição de políticos, lobistas e empresários que passaram boa parte de 2015 atrás das grades por ordem do juiz federal Sérgio Moro.
Solto em 18 de novembro após homologação de seu acordo de delação premiada, o lobista Fernando Baiano era personagem célebre na cadeia. Ele foi um dos detentos que mais se esforçou para agradar os companheiros de cela. Frequentou cultos evangélicos para se enturmar com os detentos, comprou e distribuiu Bíblias. Fazia também as vezes de cicerone na prisão para cada empresário novato e amedrontado que acabava de cair na mira da Operação Lava Jato por envolvimento no escândalo do petrolão.
Outra característica de Baiano que chamava a atenção dos colegas e agentes federais era a preocupação com a arrumação da cela - ou os traços claros de transtorno obsessivo-compulsivo, dizem pessoas que acompanharam a rotina do lobista. O alagoano de nascimento e baiano de alcunha fazia questão de bater e alinhar os lençóis a cada bate-papo em uma das camas do presídio. Segundos após um respingo na pia, lá vinha o prestativo Baiano com um pano seco para pôr fim à desordem. E assim se manteve durante o quase um ano em que ficou preso.
Perrengues - A vida na cadeia forçou ainda um dos grandes empreiteiros do petrolão a desentupir o vaso sanitário da carceragem da PF. Houve ainda quem chorasse copiosamente a caminho da cadeia - caso de Paulo Dalmazzo, ex-executivo da Andrade Gutierrez. Já os empresários da Mendes Júnior receberam autorização para ter banhos aquecidos no rigoroso inverno curitibano.
Contra o tédio, boa parte dos presos estrelados dedicou-se à ginástica, caso de Baiano, um malhador contumaz, e do herdeiro do Grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht. Houve até uma espécie de equipe fitness de detentos da Lava Jato. Enquanto isso, o ex-ministro José Dirceu distribuía conselhos políticos e empresariais aos companheiros de cárcere. Outro político na mira da Lava Jato, o ex-deputado Pedro Corrêa, médico de formação e condenado a mais de 20 anos de prisão, fazia consultas informais para os colegas. De quebra, aceitava pedaços de carne ou o macarrão que sobravam dos outros presos.
O sexo e a cadeia - Em momentos à lá Big Brother Brasil, o ex-diretor da área internacional da Petrobras Jorge Zelada brincava com os demais sobre a falta de vida sexual na cadeia. No burburinho da carceragem, presos comentavam ainda sobre os sucessos e fracassos de cada nova tentativa de delação premiada. Foi numa dessas conversas, aliás, que supostamente o doleiro Alberto Youssef soube com antecedência da decisão de Fernando Baiano de ajudar nas investigações - fato que trouxe à tona em depoimento à CPI da Petrobras. As rodinhas eram alimentadas ainda por piadas sobre os advogados que mais estavam faturando com as colaborações judiciais. Muitos presos imploravam para eles próprios conseguirem o benefício.
Entre os advogados que atuam no petrolão, houve quem admitisse que temia ser preso por ordem de Moro após mandados de busca e apreensão. Boa parte das bancas de defesa não poupou críticas à atuação da criminalista Beatriz Catta Preta, que reinou absoluta nas primeiras delações da Lava Jato e acabou deixando os casos com a mesma velocidade com que chegou ao estrelato. Foram frequentes os boatos de venda de trechos de delações premiadas.
Surto - Em alguns momentos, a tensão atingia o nível máximo. Como quando filhos menores de idade do ex-deputado petista André Vargas encontraram o pai fora da rotina tradicional de visitas à cadeia, em uma sala reservada e sem a atenção da imprensa. Ou quando um dos mais importantes presos da Lava Jato, acreditando estar em vias de fechar um acordo de delação premiada, comemorou, à sua maneira, debaixo de um lençol. Em um aparente surto, um dos presos ainda urinou e defecou em uma pia.
Nas conversas entre policiais, contudo, nada provocou tamanha consternação quanto o momento em que um dos agentes da PF em Curitiba se matou, em 2014, depois de se apaixonar pela doleira Nelma Kodama, comparsa e ex-amante de Alberto Youssef em um esquema bilionário de lavagem de dinheiro.
Celebridades - Do lado de fora das grades, o ex-presidente da Camargo Correa Dalton Avancini não se furtou de ser fotografado em um 'bandejão' pouco antes de depor ao juiz Sergio Moro. Já o ex-diretor Paulo Roberto Costa, delator como Avancini, foi visto mais de uma vez em churrascarias de Curitiba antes de prestar depoimento.
Ao longo de 2015, para despistar antes da deflagração das mais importantes fases da Lava Jato, alguns dos policiais, por temor de vazamentos ou grampos, propagavam que estariam de férias. Já Newton Ishii, o célebre Japonês da Federal, não hesita em tirar selfies com fãs que se aglomeraram em frente à sede da PF. O mais famoso personagem da Lava Jato, que se tornou meme dada a frequência com que aparece ao lado dos presos na operação, conheceu a marchinha de Carnaval feita em sua homenagem e diz já não conseguir sair nas ruas sem ser aplaudido. Curitiba produz suas celebridades.

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